RIO — Composta há quase 10 anos, a música “Luz com trevas” seria o estopim do primeiro disco solo do multiartista Cabelo, cuja obra é marcada pelo trânsito entre diferentes linguagens, como as artes visuais, a poesia, a música e as ações performativas. Antes de virar o álbum homônimo, contudo, “Luz com trevas” batizou uma exposição individual no Centro Cultural BNDES e um show solo, ambos em 2018. Agora, também dá título a sua primeira live, que será realizada neste sábado, às 18h, nos canais digitais da Cerveja Praya, na qual Cabelo apresentará as nove faixas do álbum recém-lançado, ao lado do guitarrista Maurício Negão e do DJ Nado Leal .
O tempo entre as primeiras gravações, divididas entre 2018 e 2019, e o lançamento, não tornou o disco datado, muito pelo contrário. Até mesmo a faixa-título, composta em tempos bem diferentes do caos causado pela pandemia de Covid-19 e a crise política no país, ganha contornos atuais com versos como “Big bang bang/ Rambo X Rimbaud/ Ovo-bomba/ Explode/ Do buraco negro do gueto/ A luz escapa como pode”.
— A gente já vem vivendo estas situações há algum tempo, agora elas ficaram mais agudas. Mas o disco não é um lamento, é uma convocação da arte e da poesia para que possamos enfrentar esses podres poderes — destaca Cabelo, que transformou a inspiração dos versos em esculturas, como os seus “Ovos-bomba”. — No fim das contas, aconteceu tudo no tempo certo. A poesia é o que deflagra a criação, não tem diferença se depois vira uma obra plástica ou uma música.
Outra curiosidade da faixa, conectada com o presente, é uma citação às trilhas dos westerns de Sergio Leone compostas por de Ennio Morricone, morto na última segunda-feira, aos 91 anos.
— É engraçado porque muita gente acha que é um sample do Morricone, mas foi um assobio gravado no estúdio pelo (cantor e multi-instrumentista) Milton Guedes — conta Cabelo. — A gente queria dar ao “big bang bang” um clima de faroeste das periferias, e o Milton foi perfeito. Ele fez três gravações idênticas, até assobiando ele é afinado.