Sempre em letras maiúsculas e com ponto de exclamação. É assim que o coletivo de artistas OPAVIVARÁ!, do Rio de Janeiro, escreve seu nome. Criado em 2005, o grupo já passou por várias formações, entre três e sete integrantes. Atualmente são quatro, mas frequentemente são mais, contando os agregados, os parceiros, os colaboradores, as chamadas "famílias expandidas" e todos os presentes nas situações que eles propõem para fazer o trabalho acontecer.
Em nome da importância da voz coletiva, eles evitam identificar-se individualmente, principalmente se for para publicação. Ao vivo, em cores, não se escondem das câmeras e, se alguém perguntar o nome de cada um deles, vai obter a resposta. "A ideia é diluir a importância da autoria individual e ressaltar a do coletivo, curtir a confusão de ter gente que acha que somos 20 integrantes. A audiência é convidada a sair de seu papel contemplativo e se tornar ativa e parte integrante da obra, dissolução total entre artista e espectador", escreveram à seLecT. A entrevista foi feita por e-mail em março, mês em que montaram SOLAROCA, uma grande oca feita com guarda-sóis coloridos na área externa da Art Dubai, nos Emirados Árabes.
A instalação recebeu também as famosas cadeiras de praia triplas criadas pelo coletivo. "A forma redonda e circular faz uma referência às ocas indígenas brasileiras e às tendas tuaregues. As cadeiras convidam ao encontro e a um tempo desacelerado. O som do vento nos guarda-sóis traz um pouco do ambiente das praias cariocas e as cores no espectro do arco-íris não estão aí à toa", comentam.
Dar nomes expressivos às obras relacionais faz parte da tradição do coletivo. BRASA ILHA (2018) é uma velha perua Brasília que fica estacionada com um forno ou uma grelha a carvão ligados, assando comida e servindo para quem passar: "Uma brasa ilha flutuante nômade ambulante de aquecimento social", como dizem. SELF-SERVICE PAJÉ (2011) é um display com 60 ervas medicinais e cardápio-bula, que o público pode manipular, preparar seus chás e ingerir para o prazer ou a cura.
NAMOITA (2006) é um lugar criado num espaço público, parcialmente escondido atrás de plantas, para servir de antipalco e antibunker, "espaço intermediário e provisório entre público e privado, o íntimo e o coletivo".
Alegria, alegria
SOFÁRAOKÊ (2015) é um sofá estampado com microfone e alto-falantes embutidos para que as pessoas possam soltar a voz como num karaokê. SALADA MISTA (2007) permite que pessoas e frutas se misturem livremente numa piscina. Parte do projeto Parede Gentil, da galeria A Gentil Carioca, que representa o coletivo, CHUVAVERÃO (2014) foram cinco chuveiros para uso dos transeuntes, instalados temporariamente numa parede na esquina em frente à galeria, relembrando as antigas fontes de água públicas que havia na cidade.
Em TRANSPORTE COLETIVO (2010), fizeram circular pelo Centro do Rio de Janeiro numa Virada Cultural três "trenzinhos" constituídos de dez triciclos interconectados cada um, "movidos a força artística". REMOTUPY (2016) é uma canoa triciclo elétrico com remos de ponta emborrachada criada para "navegar no asfalto dos rios soterrados de São Paulo". TRANSNÔMADES (2016) são carrinhos e carroças de tração humana adaptados como "acampamentos transnômades, que podem circular e se assentar em qualquer lugar" nas ruas das cidades, ao sabor da vontade dos seus puxadores.
Como se vê, leveza, precariedade, improvisação, informalidade, alegria de viver e hedonismo misturam-se na obra que frequentemente celebra a cultura popular e praieira carioca. "Outra ideia que sempre queremos fazer presente é a de Momento Público", argumentam os artistas. "Os espaços públicos de uma cidade são de fato públicos? Usualmente são espaços loteados, cerceados, controlados. O momento público busca instaurar, seja no espaço público, seja numa instituição ou numa galeria, um espaço de encontro e convívio, de trocas de saberes e sabores, criado e constituído por quem o habita", defendem.
Como tomam as decisões no processo de trabalho? Fazem votação ou buscam consenso? Qual a tensão que pode acontecer no processo? "O coletivo só existe porque estamos nesse compromisso que envolve estarmos muitas horas juntos, como uma família mesmo, não só nas viagens, mas no dia a dia das reuniões para pensar, elaborar, trocar, rir e chorar", respondem. "Não trabalhamos com representação nem com papéis definidos ou hierarquias. As decisões são tomadas sempre em conjunto, buscando, claro, um consenso, o que nem sempre é possível, mas é o grande desafio!
Junto, sem dúvida, é mais gostoso, não necessariamente mais fácil, mas bem mais gostoso. Acreditamos muito no prazer e buscamos essencialmente fazer dos nossos encontros momentos prazerosos. É importante também saber conviver com o dissenso, entender que as opiniões divergentes ou conflitantes devem ser ouvidas tanto na sociedade como um todo quanto no processo criativo. Conviver com a diferença é o que nos move, não só internamente no coletivo, mas em relação a toda a humanidade, e os nossos trabalhos propõem um espaço de encontro, conversas e trocas, entre todos sem distinção", dizem eles. Para corroborar o argumento, não só os transeuntes como também os moradores e as crianças de rua participam de suas intervenções urbanas.
Agenda cheia
"De alguns anos para cá, a parceria com A Gentil Carioca permite a nossa inserção em feiras internacionais, onde nossos trabalhos são mais vendidos do que no Brasil, a nossa casa, um lugar de cultura pulsante e diversa que nos inspira", dizem. "Os convites para trabalhos comissionados também acabam acontecendo mais no exterior. No entanto, nossa ação no Brasil não cessa. Estamos sempre buscando locais e maneiras de trabalhar no nosso país, mesmo com todos os ataques e desmontes pelos quais a cultura vem passando nos últimos anos e, principalmente, no atual (des)governo. Acreditamos nas propostas de iniciativa independente e de espaços alternativos e participamos com frequência de fóruns e debates no âmbito acadêmico, atendendo muitas vezes a demandas de estudantes e pesquisadores que se interessam pelos nossos processos."
Depois da Art Dubai, o coletivo inaugurou em abril a exposição PORNORAMA na Gentil Carioca, em cartaz até 7/6, com obras inéditas feitas especialmente para a mostra. A partir de maio, participa da exposição Vai e Vem, com curadoria de Raphael Fonseca, que vai itinerar pelos CCBBs de São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro. Estarão ainda com projeto solo no pátio do Palazzo Strozzi, em Florença, na coletiva Vivências em Montbeliard, na França, farão parte do fórum internacional de coletivos em Estocolmo, e participam de exposição curada por Nicolas Bourriaud em Montpellier, também na França.
No segundo semestre, o OPAVIVARÁ! estará no Fringe Festival, em Dublin, fará exposições na galeria Magazzino, em Roma, e na Dunedin Public Art Gallery, na Nova Zelândia. E, finalmente, em dezembro, começam as comemorações de 15 anos do coletivo com exposição no MAC Niterói.
O OPAVIVARÁ! é uma festa.